quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

O VAQUEIRO MARAJOARA ENTRE A SELA E O SANTO

Museu do Marajó
Qualquer roteiro turístico para o Marajó tem que incluir Cachoeira do Arari, onde está localizado o famoso Museu do Marajó, inaugurado em 1987 pelo ex-padre Giovanni Galo, um italiano de Turim, que por opção veio viver no Marajó. No Museu são guardadas importantes peças da cultura marajoara como uma forma de resgatar, preservar e divulgar essa cultura. No total, são 20 mil metros quadrados de área, das quais a metade abriga o Museu propriamente dito, com seu mezanino, área externa e exposição permanente. Os outros 10 mil metros quadrados estão reservados à expansão do projeto, que precisa de verbas para ser colocado em prática.
Conhecer o Museu do Marajó deixa qualquer pessoa deslumbrada tamanha a riqueza dos detalhes e das informações. Pode-se dizer que visitar o Museu é mergulhar fundo na cultura marajoara e desvendar mistérios da própria origem do Marajó.
Nada no Museu é estático. Ao contrário. O tempo todo ele interage com quem o visita, respondendo dúvidas e perguntas sobre os mais diversos temas, do mais simples ao mais polêmico. Para fazer essa interação alguns recursos são utilizados, como barbantes e placas móveis, que quando manipulados vão revelando segredos, como se fossem um computador.
O próprio Giovanni Galo classifica o Museu como um grande brinquedo ou um computador de marca caipira, ou seja, quanto mais o visitante mexe com os painéis, mais novidades ele descobre. Essas descobertas passam por peças autênticas dos índios marajoaras, curiosidades sobre as lendas amazônicas e, até como era o Marajó de ontem e como é o Marajó de hoje. Já os animais tem um capítulo à parte no Museu. Um "supercomputador" com 128 fichas coloca à mostra dados interessantes sobre o comportamento dos animais que vivem na região, despertando o interesse não só de turistas, mas também de estudantes que constantemente visitam o local.
A devoção a São Sebastião
Se tem um município paraense em que a devoção a São Sebastião é forte, esse município é Cachoeira do Arari. Aqui os festejos em homenagem ao Santo duram o ano inteiro, culminando com a festa maior, no dia 20 de janeiro.
Considerado o padroeiro dos vaqueiros e fazendeiros da região, São Sebastião é venerado pela população, que cumpre uma tradição de mais de 100 anos. Essa tradição mistura o religioso e o profano, a exemplo de quase todas as festas religiosas que ocorrem no interior do Pará. Só que em Cachoeira, o ritual ganha um tempero a mais. No meio de rezas e ladainhas tem também banda de música, cachaça e muita brincadeira. Tudo para agradecer os pedidos atendidos pelo Santo.
O ritual
_ Os preparativos para a festividade de São Sebastião começam no final de junho. Um grupo de devotos - também chamados de foliões _ sai da cidade, com a imagem do Santo, em direção às comunidades e fazendas para arrecadar o que eles chamam de "ofertório". Essa peregrinação dura aproximadamente seis meses, e onde a imagem chega é sinônimo de festa. Os fiéis ajudam como podem. Doam patos, galinhas e até dinheiro. Tudo o que é arrecadado é aplicado nas festividades de São Sebastião, que iniciam no dia 10 de janeiro. Enquanto um grupo é responsável em percorrer as fazendas, outro grupo de foliões percorre a mata atrás dos mastros que vão dar o sabor de disputa à festa. Ao todo, o grupo tem que conseguir três mastros _ um dos homens, um das mulheres e outros das crianças, sendo que o mastro maior é sempre dos homens.
Depois disso, os mastros são levados para a Fazenda Espírito Santo (próxima à cidade), onde permanecem até o dia seguinte ao Círio de Nossa Senhora da Conceição, no terceiro domingo de dezembro. Da Fazenda, os mastros saem para ser ornamentados na casa dos festeiros (pessoas escolhidas previamente pela comunidade para comandar a festa) e lá permanecem até o dia 10 de janeiro para aguardar a chegada da imagem do Santo, trazendo as oferendas, que geralmente são vendidas em leilão durante as festividades.
O encontro da comissão dos mastros com a imagem de São Sebastião é um dos mais bonitos e emocionantes da festa. Os mastros são colocados no chão e os foliões agradecem as bênçãos e fazem novas promessas. Após esse ritual, a procissão ganha as ruas, já em ritmo de festa. As festividades se encerram no dia 20 de janeiro, dia de São Sebastião. Antes, é claro, acontece a tradicional derrubada do mastro, que acirra a disputa entre homens e mulheres e marca o auge das homenagens a São Sebastião.

(divulgação)




tipos brasileiros - série IBGE, "Vaqueiro Marajoara" (bico de pena por Percy Lau).

COMENTÁRIO a seguir sobre palestra realizada por Marinete Silva Boulhosa no 18º Dia do Marajó, programa VIVA MARAJÓ patrocinado pelo Instituto Peabiru / fundo Vale (Belém, 31/01/2012).

Marinete Silva Boulhosa - "Entre a Sela e o Santo: Um estudo sobre a identidade do vaqueiro marajoara". 2007. Dissertação (Mestrado em Antropologia) - Universidade Federal do Pará.

O HOMEM E A BIOSFERA

Confesso que apesar da linda família e os bons amigos que a vida me deu, estou meio saturado de viagens, reuniões e muito blablablá. Portanto, neste meu ofício voluntário de escrivão da beira do Rio-Mar, foi com alegria que assisti a palestra da professora Marinete Silva Boulhosa sobre esse peculiar Vaqueiro Marajoara; que me animei a gastar umas linhas a mais na rede mundial de computadores (na sigla em ingles WEB).

me lembrei da mea juventude distante, em Ponta de Pedras, quando uns poucos nos reuníamos debaixo da frondosa mangueira em frente da baíuca "A Poronga", propriedade do colega Arrison Cleveland Alencar, o único "arremediado" daquela tuna auto-apelidada "turma da Poronga"...Quando um de nós avistava o outro costumava chamar "Ó da Poronga!"... Carmosino Malato, José Malato, Bianor Machado, Suetônio Andrade e outros...

pouco a pouco cada um pegou a canoa veleira e atravessou a perigosa baía com ânimo definitivo de morar na cidade grande em busca de estudo e emprego que não existiam na ilha. As ilusões e enganos da mocidade me levaram à redação do "Jornal do Dia" onde o mestre Claúdio de Sá Leal transformava focas bisonhos em repórteres. Este não foi meu primeiro emprego, na verdade eu dividia a pequena cidade de Ponta de Pedras com o sítio Serrame, no rio Curral Penema, onde o pai de minha mãe havia deixado quarenta cabeças de gado, um casarão arruinado e um pedaço de campo... A doença de minha mãe com a decisão paterna de levar de vez a família para Belém, foram prepoderantes para aquela mudança.

até aí eu fui um esforça aprendiz de vaqueiro, apanhador de açaí, remador de canoa montaria e até já me atrevia alguma vez em "pegar o leme" de igarité no ir e vir entre a ilha e o Ver O Peso: o caminho para os "goiabas" dentre os quais eu me achei era o Rio da Fábrica (que teve este nome devido à uma "fábrica" de selas dos frades das Mercês instalados com engenho na ilha de Sant'Ana). Passageiro da igarité freteira "Fé em Deus" do senhor Dário Cabral Noronha, peguei muita maresia na boca do Fábrica, nu que nem um índio na canoa "chapada" de rasas de açaí, madrugadas conforme a hora da maré e do vento, tremendo de frio, enquanto o farçado banho das ondas não passava pra fazer o café e assistir ao inesquecível espetáculo do nascer do sol...

dormi certas vezes sob chuva fina enrolado sob a vela molhada da canoa em plena doca do Ver o Peso. A maior coça de muriçoca que já levei aconteceu no porto da vila do Jenipapo (Santa Cruz do Arari), na minha primeira viagem ao lago Arari onde fui com o "pareceiro" Ovídio Araújo Freitas fazer estreia como marreteiro... Ao contrário dos colegas da turma da Poronga, saí quase escondido que nem "jebrista" pelo rio da Fábrica. Com o camarada Ovídio tentei me estabelecer com banca na feira, mas desde cedo ficou claro que eu seria um desastre comercial. 

por sorte um primo meu me arranjou emprego na Camisaria ABC (depois seria comprada por Rômulo Maiorana, mas eu já estava fora). Passei a ser "office boy" no escritório de advocacia de Mario Sucupira e Paulo Itaguay: isto foi uma guinada em minha vida... Me ficou desta passagem de aprendiz de vaqueiro e marreteiro à "boy" uma lição essencial. Perguntei ao velho advogado cearense: "dr. eu posso requerer" (já não me lembro o quê)! E ele na lata: "Meu filho, vc. pode pedir até o mundo, o problema é conceder...". Entendi e levei a sério: se a gente não pede, como então vai ter atendido o que é nosso direito?. Ainda em busca de um salário melhor passei a trabalhar na Drogaria Cardoso. Donde saí para virar réporter policial e ensaiar a crônica "A face oculta do Ver o Peso" à là Nelson Rodrigues...

Foi assim que já com pose de "intelectual" reapareci na pacata Ponta de Pedras para convocar a turma da Poronga para criar um "Grêmio Cultural Marajó". Era o ano de 1960, já não tenho certeza. Mas, foi o padre Guido Fossatti que acolheu a ideia e formamos com Arrisson (em caboquês, Arrissão), Carmosino e Suetônio um grupo de teatro... E desde então sempre que posso estou "pedindo" coisas para melhoria da nossa gente...

Marinete e o Vaqueiro Marajoara

Estas e outras lembranças me passaram pela cabeça enquanto a professora Marinete ia falando e passando imagens tão evocativas para minha história de vida. Estou certo de que muitos outros na plateia, como o Edir Piani e o mano Ademar Feio da irmandade do Glorioso São Sebastião. Me atrevi a perguntar à turismóloga Marinete Silva Boulhosa se ela estava acompanhando o assunto do pedido da sociedade civil para candidatura do Marajó como reserva da biosfera. Ela respondeu honestamente que ainda não estava a par. Isto me surpreende pelo fato de que sendo ela uma marajoara esclarecida, filha de vaqueiro cachoeirense e agora mestre em antropologia pós-graduada pela UFPA e trabalhando no IFPA, poderia saber...

Mas não duvido de que doravante será uma grande parceira, motivando o IFPA a entrar na roda desta luta que tem, sem dúvida, a cara do Vaqueiro Marajoara. 

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